Trazemos novamente, em especial de Fim de Ano, um conto de César Maciel, editor-assistente da nova edição brasileira e fã de Perry Rhodan desde 1985! César é um grande conhecedor da série, uma verdadeira enciclopédia viva de PR. Seu conto, finalizado em 1996, agora relançado pelo Projeto Traduções!
Zero e Um
Era um mundo belo e pacato. Grandes mares cobriam sua superfície, alternando-se com continentes exuberantes em belezas naturais. Seus habitantes eram o povo mais antigo da Via Láctea, e cuidavam de seu planeta com sabedoria. Todos tinham plena consciência de seu passado sangrento e brutal, e preservavam ao máximo a paz e serenidade que haviam conquistado.
Não era apenas paz o que haviam conseguido. O povo daquele mundo já havia atingido o mais alto grau de evolução possível, tanto física como moralmente. Seus corpos, extremamente frágeis, eram protegidos pelas parafaculdades geradas por seus poderosos cérebros, e sentimentos negativos como vaidade, inveja e ira não existiam já há um longo tempo. Uma cultura com a sabedoria de bilhões de anos não possuía mais tais sentimentos, o que por si só eliminara os conflitos entre os indivíduos, e, consequentemente, tornara inútil guerras e lutas. Em todos os sentidos, aquela cultura atingira a perfeição.
Mas havia algo ainda que poderia ser feito pela evolução daquela sociedade. Uma solução ousada, que somente ela poderia tentar. Era algo inconcebível para qualquer raça num estágio evolucionário inferior: o abandono de seus corpos físicos, com a união de bilhões de consciências individuais numa única, imortal e quase onisciente.
A Grande Unificação ocorreu em algum ponto do tempo, há milhões de anos. Através dela, toda uma raça desapareceu, dando origem a uma entidade sem corpo, sem matéria, sem nome. Esta entidade consumiu um longo tempo explorando o universo: em sua quase onipotência, permitida pela poderosa energia psiônica condensada de bilhões de seres, ela explorou incontáveis galáxias, conhecendo raças, sóis e planetas com inacreditáveis formas, características e histórias. Durante muito tempo, ela não encontrou nada que se assemelhasse a si própria. Nenhuma cultura no universo era tão antiga como ela.
Finalmente ela construiu um planeta artificial numa órbita errante pela Via Láctea, que passou a ser um ponto de referência material para si própria, além dos seres corpóreos que viajavam pela galáxia em seus frágeis envoltórios de metal. A entidade divertia-se com as ações das inúmeras raças que exploravam o universo em sua maneira limitada, pensando serem os mais poderosos seres do universo. De tempos em tempos, ela assumia uma forma física e vivia como um membro de tais sociedades, para conhecê-las melhor.
Porém, o poder absoluto e a perfeição tornaram-se muito cansativos, até mesmo para ela. Tudo que existia no universo era inferior às suas capacidades, e parecia não haver mais nenhuma fronteira a ser desbravada.
Mas, após um longo tempo de pesquisas, ela descobriu que seu universo era apenas um entre muitos, e que possivelmente haviam infinitos universos, cada um com suas leis físicas peculiares. Ela também descobriu outros planos de existência, nos quais todas as possíveis linhas de tempo ocorreram, tornando todos os acontecimentos possíveis reais. Era um novo e infinito campo de descobertas, digno de sua existência. Todo o tempo de vida restante para o nosso universo não seria suficiente para conhecer tudo que ela desejava. Sua existência adquiriu um novo sentido.
Durante milhões de anos, ela acumulou conhecimento sobre milhões de universos paralelos, com incontáveis leis físicas e possibilidades de acontecimentos. E, em vários universos, ela encontrou-se com superinteligências como ela, com os mesmos propósitos. Entretanto, algumas eram intrinsecamente más, tendo o objetivo não somente de conhecer, mas de conquistar e dominar. Felizmente, as barreiras que separavam os infinitos universos eram grandes demais até mesmo para as superinteligências, que só conseguiam superá-las às custas de imenso dispêndio de esforços.
Porém, um dia, aconteceu algo já previsto por ela, e que poderia ter consequências imprevisíveis. Vários superseres negativos estavam unindo-se para poder transpor as barreiras dimensionais, e conquistar outros universos. Um desses seres era exatamente igual a ela só que com uma história inversa, onde a Grande Unificação serviu apenas como um meio para dominar sua galáxia de origem, e, depois, todo seu universo. As perspectivas pareciam terríveis, pois em algum momento no futuro ela teria que confrontar-se com seus negativos, numa batalha de proporções inimagináveis.
Nesse momento, entraram em atuação as fontes de matéria, um poder primordial em seu universo criado há incontáveis eras para manter a ordem. Ela encontrou-se com um de seus representantes, que deu-lhe a missão de encontrar dois seres que os ajudariam em sua luta contra os destruidores de matéria. Durante muito tempo, ela procurou os dois seres, através de enigmas galácticos que somente os mais capazes poderiam decifrar. O primeiro destes seres foi o arcônida Atlan, que recebeu um ativador celular. Dez mil anos depois, o terrano Perry Rhodan, que começava a trilhar o caminho das estrelas juntamente com a Humanidade, recebeu o segundo ativador. Com isso, sua busca estava completa, restando apenas preparar-se para a inevitável batalha.
Mil e quinhentos anos após o surgimento de Rhodan, a superinteligência negativa mais parecida com ela própria, vinda de um universo paralelo idêntico ao dela, consegue romper as barreiras dimensionais de uma forma limitada e começa a travar um jogo de xadrez cósmico com sua contrapartida positiva. Rhodan, Atlan e mais incontáveis raças da Via Láctea e de outras galáxias são figuras decisivas nesta luta. Após a união de várias forças positivas, o superser negativo é rechaçado, porém a ameaça permanece latente.
A partir deste momento, a polarização das forças positivas e negativas atinge um ponto culminante, com ambas as superinteligências consolidando seus respectivos esquemas de poder. A entidade sabe que, no futuro distante, uma das forças dominará os universos, e teme que o resultado da luta tenha um desfecho trágico. Ela sabe que, enquanto os seres positivos seguem as leis da moral, acreditando na ordem e na justiça, os seres negativos apenas fazem o que querem, não preocupando-se em matar trilhões de seres viventes, se for conveniente para eles.
A entidade, também conhecida como “AQUILO” pelos terranos, tenta fortalecer seu poder para conseguir subjugar seus inimigos, e tornar a ordem reinante em seu universo.
Mas ela sabe que a luta dos polos, que provocou o nascimento de seu universo, também vai provocar sua destruição. Se as forças negativas estiverem prestes a vencer a luta titânica, ela não hesitará em adotar a Solução Final, e sabe que os negativos farão o mesmo em caso contrário. Os terranos e as outras raças são apenas uma maneira de adiar o inevitável “Big Crunch”, assim como raças de outros universos contribuíram, no passado remoto, para o “Big Bang”.
FIM
César Augusto F. Maciel
27 de Maio de 1996
Revisão em Dezembro de 2017